terça-feira, 24 de agosto de 2010

Dona Alzira


O sotaque alemão puxado, as mãos fortes, o senso de humor marcante e aquelas bochechas... Nossa, dona Alzira, tu já deixas tantas saudades!

Como a grande estrela que sempre foi, fechou as cortinas da vida sem aviso prévio, deixando a plateia inteira de boca aberta, sem saber como se comportar – sem saber se chorava ou batia palmas pela tua atuação

E foi um grande espetáculo: 99 anos da mais plena existência. Se por um lado a família de sangue era pequena, dona Alzira tinha um talento gigante para conquistar novos seguidores. Era abrir aquele sorriso e lá estava uma nova leva de filhos postiços, além de netos e bisnetos.

Mais do que fazer amigos em cada esquina, dona Alzira era conhecida pela extrema resistência. Até poucos anos atrás pegava ônibus só para ir ao Mercado Público comprar peixe para um almoço. A tua lucidez chocava. Era maravilhoso sentar em sua sala e poder ouvir memórias riquíssimas de um tempo anterior à Segunda Guerra Mundial – e cheias de detalhes - que ela, como boa contadora de histórias, jamais deixava escapar

Acredito que o segredo de (quase) um século de vida plena tenha sido o jeito como ela lidou com tudo que surgiu. Sofreu? Sim, muito. Não deve ser nada fácil se despedir (um a um) daqueles que passaram pelo caminho: irmãos, marido e, até mesmo, um filho. Mesmo assim, depois do luto vivido, ela levantava a cabeça e seguia em frente. Sabia que tinha uma missão a cumprir e que a jornada continuava.

Um dia me disse que vivia tanto e tão bem porque gostava muito da vida. E era só olhar para ela, com aquele sorriso de orelha a orelha, que sabíamos que (mais uma vez) ela estava sendo sincera.

Vou guardar para mim aquela imagem da minha avó, na frente do portão de sua casa, acenando para o nosso carro, cada vez que nos despedíamos. Sempre soube que esse dia chegaria e que aquele aceno seria um “adeus” e não mais um “até logo”. Só não sabia que ele chegaria assim, de supetão.

Para nós, a tua plateia, os teus fãs mais verdadeiros, fica aquela saudade eterna e aquela vontade de ouvir uma última história, só mais uma gargalhada e sentir aquele poderoso abraço.

Saudade, vó Alzira. Muita saudade. Para ti, somente as minhas palmas.

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